segunda-feira, 19 de abril de 2010

21 DE ABRIL, DIA DE QUE MESMO?

O teatro luso montado, regado por um bom aparato mítico-cristão; pintado em telas Portinari; escrito em parte por europeus; elaborado pela própria repressão; romanceado em parte pela literatura brasileira; ostentado pela educação básica; inspirado na independência norte americana, em 1776 e com um tom real da coroa portuguesa, na pessoa da Dona Maria I; está aí a data festiva.

Na verdade, esse negócio de endeusar personagens históricos no Brasil nunca atraiu-me muito; até porque sou meio ateu no que concerne as datas comemorativas. Deixe-me perguntar-lhe: 21 de abril é dia de que mesmo? Uma coisa eu sei, é feriadão e dia de descanso para muitas pessoas. Você já reparou que o nosso José da Silva o Tirar-dentes assemelha-se muito à figura do Cristo crucificado? Você já reparou que esse heroísmo está no sudeste do país? Você já reparou que o herói alferes era comandante do exército, companhia dos Dragões? Você já reparou que na agitação da Vila Rica de 1789, só destaca-se a figura do grande Tirar-dentes?
Bom, vamos continuar reparando? Você já reparou que a temática escravidão não é tocada na mágica história da Inconfidência? Você já reparou as especulações históricas que apresentam o Tirar-dentes como proprietário de escravos? Você já reparou que os critérios utilizados por ele, foram os mesmos utilizados pela coroa portuguesa?
Explico-lhe melhor, trata-se de problemas meramente político-econômicos, gerados pela crise do sistema colonial, isto é, movimento de branco para branco, de livres para livres, de elite para elite. Você já reparou com em toda história mítica, sempre tem um herói e um traidor? Você já reparou a figura do chamado traidor português Joaquim Silvério dos Reis, o Montenegro? Você já reparou que de acordo com algumas especulações históricas, o herói Tirar-dentes procurou ajuda lá pras bandas do Rio ao seu traidor? Você já reparou as mortes e prisões ocorridas antes do grande Tirar-dentes?
Pois é, o título da presente reflexão já conduz-nos a pensar bastante. Na verdade, dos sete personagens que foram condenados pelo tribunal do Rio em 1791, apenas destaca-se a figura do Tirar-dentes. De notar que era preciso exaltar uma imagem do herói exaltado, martirizado, sofredor, guerreiro, condenado injustamente, em suma, mais um herói nacional. Atente para as semelhanças cristãs do mártir mineiro.

O José da Silva foi condenado a percorrer as principais ruas da Vila, conduzido a forca, decapitado, esquartejado e exposto ao público nos postes da Vila mineira. Repare nos símbolos pregados pela história dos inconfidentes. O personagem barbudo, magro, abatido, condenado injustamente, percorrendo acorrentado as avenidas, silencioso, rumo ao lugar da ignomínia, diante da guilhotina francesa, pronto para entrar na história dos heróis nacionais. As feições idealizadas de Jesus Cristo não são novidades na história, basta reparar o Conselheiro, mas isso é outra história. Bom, voltando ao Crisdente, - coisa da minha cabeça -; quero imaginá-lo conversando com o crucifixo ofertado pela igreja na prisão. O Crisdente; entendeu né?

Diz a história que sua cabeça sumiu misteriosamente. Já imaginou no sumiço do corpo do Cristo? Talvez, se o Crisdente não tivesse sido esquartejado, seu corpo também sumiria, quem sabe? A velha república depois de certo tempo encarrega-se de transformar a imagem do rebelde político revolucionário em figura mística, regada por um bom aparato religioso católico-romano. O mito Crisdente por certo tempo foi esquecido, mas graças ao fenômeno da chamada Proclamação da Republica, o mito reviveu com pompa. Desse modo, cabia aos republicanos nostálgicos conquistar respaldo popular no novo regime político. Para isso, tornava-se bem mais fácil como estratégia política, rememorar a imagem do mártir Crisdente, esta bastante enfatizada e reforçada ao extremo a partir do ano 1890, portanto, quase um século depois de sua morte. Repare no ano de 1965, em pleno nascedouro da ditadura militar no País; o grande paradoxo histórico em declarar o mártir revolucionário no “patrono cívico da nação brasileira”. Como não bastasse, decretou-se a fixação da imagem do mártir em todas as repartições públicas, detalhe, barbudo, cabeludo e de feição Cristica. Pra terminar, resta-me obedecer ao feriado imposto e imaginar à semelhança de uma criança, o Tirar-dentes ou o seu José da Silva, bem diferente do que pintam os livros. Bom feriadão de Crisdente pra você!

P.S.: Repare a coleção sobre os rebeldes brasileiros, da editora Casa Amarela.

Adriano Trajano
Pastor da Igreja Batista em Chã Preta/AL

Fonte: http://www.pastoradrianotrajano.blogspot.com/

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado pelo seu comentário, pois é de suma importancia a sua opinião. Continue conosco. Deus te abençoe.

Receba os artigos deste blog por email se cadastrando gratuitamente

Digite seu endereço de e-mail:

Delivered by FeedBurner

25 anos da PIBBANS II