segunda-feira, 15 de março de 2010

“TÁ AQUI MINHA CARTEIRA!”

Eu não poderia deixar de escrever algo sobre o trágico e cômico episódio dos policiais civis e a gerente dos cinemas do Shopping Pátio Maceió, ocorrido no último dia oito de março que por ironia do destino, comemora-se o dia internacional da mulher.

Longe de generalizações, até porque tenho amigos que são da polícia civil e porque ainda existem policiais civis honestos, que prezam pela ética e boa conduta profissional em prol do bem estar da população.

Certa vez lendo o grande antropólogo Roberto Damatta; descobri que no Brasil basta perguntar: “você sabe com quem está falando rapaz? Aqui em Alagoas, não pergunta-se, mas afirma-se: “tá aqui minha carteira rapaz!”

O filme não sai da minha mórbida consciência. Aquela mulher rodeada de mais de meia dúzia de policiais civis, desfilando pelos principais corredores do shopping e escada rolante adentro.

Aquelas autoridades sérias e competentes conduzindo a gerente dos cinemas, cujo “crime” foi cobrar pelos ingressos dos nobres policiais. Antes de adentrar-me no ápice do episódio, quero voltar meu olhar para os primórdios desse acontecimento circense.

Para inicio de conversa, trata-se de um episódio típico, histórico-cultural e social do nosso Brasil, principalmente no Nordeste. Em Alagoas não podia ser diferente; só que dessa vez, muito bem representado pelos holofotes midiáticos em nível nacional.

Imagino aqueles policiais na prévia das carteiradas conversando: “vamos lá rapaz, somos policiais; a gente não precisa pagar não; quem já se viu policial pagar pra entrar em nenhum lugar? Somos autoridades, chegando lá é só mostrar a carteira e pronto, resolvida a situação... . O filme que tá passando é massa e lá, o cinema é de última geração, vamos embora”.

Lá se vão aqueles policias rumo ao cinema com resolução de 3D e mais cobiçado no momento, na capital alagoana. Quando chegam ao local combinado, tiram subitamente suas carteiras timbradas exibindo-as com desdém à funcionária dos cinemas e dizendo: “tá aqui a carteira, somos policiais”.

Para as suas surpresas, foram impedidos justamente de assistirem de graça ao filme naquela tarde de segunda. Dando asas a minha imaginação, posso imaginar as caras daqueles policiais quando receberam um não, imaginem comigo os policiais nervosos: “nós somos policiais senhora, reparou as carteiras não? Você tá pensando que pode barrar a gente de entrar é? Tá aqui nossas carteiras, olhe direito.”

Interessante notar que de acordo com a reportagem exibida nacionalmente, a justificativa alegada pelos nobres policiais foi a de uma possível investigação sobre a existência de um possível tráfico de drogas no local.

Após serem barrados na bilheteria, os policiais viram suas autoridades ameaçadas, logo, sagazmente, resolveram chamar mais companheiros de trabalho, para assim mostrem que são de fato, autoridades com direito a entrada franca em tudo que se cobra entrada.

Ainda continuo imaginado aqueles policiais conduzindo a gerente dos cinemas até as viaturas estacionadas enfrente ao shopping, isto, expondo publicamente a imagem daquela mulher, uma vez que, segundo ela, há várias entradas restritas nos cinemas, mas mesmo assim, as autoridades policiais não deram importância.

Dá para imaginar aqueles policiais nervosos conversando entre si: “rapaz, ela tá pensando que é o quê? Barrou a gente, quem já viu isso aqui? Ela vai vê com quem mexeu, não podia ter deixado a gente entrar para evitar esse tumulto? Agora ela vai vê o que é bom.”

A essa altura, o circo já estava armado. Segue-se a procissão shopping afora, cujo objetivo, quiçá, era de mostrar publicamente que com policiais não se brinca, principalmente em bilheteria de cinema de última geração.

Para a minha surpresa, perdoem-me as mulheres alagoanas; aquela gerente não é do paraíso das alagoas. Acredito que constitui-se motivo o suficiente para este caso vir à tona. Talvez, se ela fosse uma alagoana, não teria a mesma ousadia de tornar público um caso típico como este em nosso estado.

Em primeiro lugar, porque o espírito de medo e subserviência e de impunidade, ainda predominam, perpassando os limites histórico-temporais em nosso estado. Em segundo lugar, porque aquela mulher não reside na periferia ou interior do estado, o que significa dizer que, provavelmente, não teria a coragem de denunciar tal abuso, principalmente, tratando-se de policiais civis.

Para azar dos policiais, a gerente dos cinemas não era uma alagoana, filha de algum conhecido, a mando de Dr. Fulano ou Beltrano. Era simplesmente uma profissional, no exercício do seu dever.

Infelizmente, foi preciso ganhar repercussão nacional para o caso providenciar reunião das principais instâncias de segurança do estado. Infelizmente, o nome de Alagoas está mais uma vez no topo dos flagelos e descasos da dignidade humana no País.

Acompanhando o ocorrido, tudo indica que a possível investigação alegada pelos policiais é falsa e, mais, de acordo com a gerência do shopping, não existe nenhum protocolo firmado que trata desse assunto entre o centerplex e a Policia Civil.

Quanto à funcionária, é bom ficar de olho, afinal, estamos mergulhados em uma densa nuvem de violência e impunidade que assola nosso país, não achas?

A esta altura, parece-nos que as investigações estão sendo feitas a passos lentos, mas, contudo, espera-se que providências sejam tomadas em breve para que assim, possamos acreditar um pouquinho na segurança pública do nosso estado.

Adriano Trajano
Pastor da Igreja Batista em Chã Preta/AL

Fonte: http://www.pastoradrianotrajano.blogspot.com/

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado pelo seu comentário, pois é de suma importancia a sua opinião. Continue conosco. Deus te abençoe.

Receba os artigos deste blog por email se cadastrando gratuitamente

Digite seu endereço de e-mail:

Delivered by FeedBurner

25 anos da PIBBANS II